quinta-feira, 1 de julho de 2010

Schopenhauer e o pessimismo como estilo de vida


Seria ele o precursor da psicanálise? Mesmo tendo morrido em 1860, quatro anos após o nascimento de Sigmund Freud, Schopenhauer contribuiu, sim, para a estruturação desse conceito. Além disso, ele foi fundamental para a construção de todas as críticas contra o racionalismo hegeliano. Schopenhauer criou um novo sistema de pensamento, com o propósito de ver a vida a partir da ótica do homem e de sua natureza “desejante”.

Para Schopenhauer tudo que existe é vontade. A vontade cria os mundos e se manifesta em diferentes níveis, e o homem estaria no topo desta hierarquia. Porém, isso não faz do ser humano um privilegiado. Pelo contrário: no homem a vontade é o desejo, o que significa que em cada um de nós há uma realidade subjacente, que determina nossas ações, nossas escolhas e nossas vidas. Também é esta vontade a responsável pela condição sofredora do homem. O desejo implica em uma falta, ou carência, que lhe é anterior, assim, o homem deseja porque sempre lhe falta algo. O desejo, por sua vez, nos leva a uma busca por um objeto que jamais poderá completar plenamente essa carência. Desta forma, é possível concluir que não existe objeto de desejo que possa preencher nosso vazio.

Portanto, quando nosso desejo é saciado o que ocorre não é um estado de satisfação plena. Vem à tona nosso estado de tédio. E esse estado só poderia ser superado no momento em ocorre a reincidência do desejo, ou seja, quando o ciclo continua.

Já nos deparamos com o problema. Somos seres destinados a desejar e a sentir tédio. Schopenhauer dá este diagnóstico de forma radical: não vale a pena viver neste ciclo vicioso e deprimente. A única saída para uma vida menos dolorosa e para lidar com a condição humana de sofrimento - gerada pela intensidade que a vontade se manifesta - seria criar objetos ficcionais para fugir do tédio e criar uma motivação. Mesmo assim, não há expectativa de alcançar a felicidade e, sim, o tédio: um estado momentâneo de ausência de desejo. Assim, para nós, humanos, resta caminhar e oscilar entre o desejo e o tédio e criar um “faz de conta”, que nos ensine a acreditar que não é tão duro viver.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

A busca de Dalí




Salvador Dalí já nasceu carregando o peso da morte. Recebeu o mesmo nome de seu irmão, que falecera dois anos antes de seu nascimento. Quando Dalí deu seu primeiro choro, a família ainda enxugava as lágrimas da perda do filho. Assim, Salvador ouvia constantemente comparações com seu irmão que estaria no céu. Além disso, Dalí havia sofrido a perda da mãe muito cedo. Dessa forma, nada mais natural que, mais tarde, já adolescente, o futuro artista tenha se tornado um obsessivo com a morte. “O primeiro fantasma de minha vida é a morte”, costumava dizer.

Na tentativa de fugir do seu fantasma, Dali mais se aproximou dele. Ficou obcecado pelo “verdadeiro significado” do clássico quadro “Angelus”, de Jean François Millet. A pintura realista denuncia a questão social: mostra um casal de humildes camponeses colhendo batatas, porém o artista exibe a disparidade e a injustiça, já que a maior parte do que é colhido vai para uma cesta distante, representando o dono da terra. Porém, Dalí não estava satisfeito com essa interpretação. Ao pesquisar, Salvador descobriu que o quadro inicialmente representava o enterro de uma criança recém-nascida: no lugar da cesta de batatas estava a cova. Para provar sua descoberta, Dalí pediu autorização ao Museu do Louvre para radiografar a obra de arte. Com a obtenção do alvará, foi possível perceber que Salvador estava certo.

As dificuldades de Salvador Dalí em lidar com a morte transformaram-se mais tarde em problemas sexuais. Durante o final da adolescência e o início da vida adulta, Dalí lidou com a impotência, sem nenhuma raiz fisiológica. Mais uma morte cercava Salvador. Entretanto, na sua constante tentativa de fugir da morte, Dalí transformou a energia libidinal em fonte de criação.

Em sua obra, é possível perceber a grande repetição do mesmo rosto, como uma tentativa de retornar ao passado para descobrir a origem de seus projetos. A propagação da forma de Angelus, de Millet, comprova a grande obsessão de Dalí por esta obra, como se este quadro fosse a projeção do que Salvador gostaria de ser. Iniciava-se assim um processo consciente e inconsciente sobre o resgate do trauma, a partir de uma paranóia crítica.

A paranóia pode ser encontrada em diversos quadros de Dalí: em “A persistência da memória”, ele faz um auto-retrato dele com o irmão. Os relógios derretidos aparecem em toda tela relacionando-se ao tempo distorcido, à persistência da memória, ao retorno para descobrir a origem dos seus traumas. Os objetos amolecidos também representam a sua impotência sexual. Já no fundo do quadro, Salvador coloca uma porta, como símbolo da esperança. Seria necessário abrir compartimentos para chegar aonde ele desejava: na origem de toda paranóia. Porém, para chegar até ela, Dalí precisaria ultrapassar todo o primeiro plano do quadro: o caixão, a árvore morta, os relógios derretidos, o perfil do irmão no chão, todos símbolos de uma morte que servia de inspiração para o grande Salvador.