segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

no lixo.


Ele dizia que tinha problemas psiquiátricos. Não podia encontrar um conhecido, que já contava sobre sua rotina de remédios tarjas preta e vermelha. "A receita fica apreendida na farmácia, então, é uma batalha não esquecer de levar o frasco para todo lugar. Imagina, como vou poder comprar sem a receita?", se lamentava com o vizinho.

No fundo, ele sabia que a história das receitas do Rivotril, Lexotan e Sulpan já eram velhas conhecidas de seus poucos conhecidos. Evitava sair de casa, exceto para ir ao psiquiatra. Eram três consultas por semana. Até mesmo em feriado o Doutor o atendia. E ele, responsável, nunca havia faltado uma consulta, sequer havia chegado atrasado.

Um dia saiu na rua e esqueceu seus vidrinhos de remédio. Buscou em todos os bolsos, carteiras, e nada. Foi direito ao psiquiatra conseguir uma receita. Com o papel em mãos se tranquilizou, afinal, agora, poderia comprar seus remédios em qualquer farmácia.

Assim, resolveu caminhar. O consultório ficava na Rua São Clemente e ele nunca tinha passeado por ali. Reparou na vista do Cristo Redentor, guardou a receita na carteira, e foi andando sem pressa.

Passou por diversas farmácias - mas não parou. Observou a quantidade de carros em fileiras, com seu faróis ligados ao entardecer. Viu as mesas dos bares começando a encher de trabalhadores em seu pós-expediente. Até os vidros da academia de ginástica o paralisaram, afinal, nunca tinha reparado na quantidade de gente que fica correndo nas esteiras de frente para uma das ruas mais movimentadas do Rio. Passou novamente por uma farmácia. Desta vez, ele parou. Foi em direção ao lixo e jogou sua receita médica ali mesmo. Esqueceu os medicamentos e continuou a caminhada.