sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

2013

Inevitável chegar neste período sem pensar no ano novo que já está batendo a nossa porta. A virada simbólica pode se tornar real quando colocamos em prática, a partir do dia primeiro, os planos que estão nos caderninhos escondidos no fundo das gavetas. Para isso, desejo a todos um 2013 de realizações. Em que haja muita coragem e determinação para lutarmos pelos nossos sonhos, que a gente tenha força para assumir nossas escolhas e encarar suas consequências.

Desejo o fim da hipocrisia, da falsidade, das pessoas egoístas e egocêntricas, de gente insensível, grosseira e dissimulada. Espero encontrar pessoas de diferentes cores, cantos e encantos, que sejam filhos de Oxum, Ogum, Xangô, Iemanjá, Iansã... Gente que vibra, que dança, que bebe, gargalha. Amigo de bar, de cinema, de livro, de cachoeira, de dança, de trabalho, de sonho. Quero ouvir o que o outro pensa, não o que desejo escutar. Quero aprender a ouvir críticas, opiniões sinceras, ao invés de me contentar com mentiras agradáveis e superficiais.

Espero, com todas as forças, que 2013 seja intenso. Traga músicas belas, rodas de samba inesquecíveis, ideias criativas, peças, filmes e livros emocionantes, paisagens impossíveis de serem fotografadas e de serem esquecidas, pessoas especiais, com experiências e opiniões diversas, cervejas estupidamente geladas, chopps com colarinho, picnics nos gramados com toalha quadriculada, passeio de barco, trilha na mata, mergulho na cachoeira, manifestações lotadas, exposições com fila na porta, mochila nas costas e pé na estrada. Durante a rotina, espero que a gente tenha a mesma garra e prazer para executar as tarefas no trabalho, interesse nos estudos e concentração para concluir todos os deveres.

Nos próximos 365 dias que virão, nos momentos em que o desânimo, a dor e a solidão vierem, que a gente consiga criar uma força interna para transformar as dificuldades em novas oportunidades de ser feliz. O bem-estar, a alegria e o prazer são sentimentos conquistados. Desta maneira, quando não conseguimos alcançar a paz interior precisamos ter a consciência que, nós mesmos, somos responsáveis pela maneira que vivemos e sentimos. Amar intensamente a vida, as pessoas, os lugares, tudo que nos cerca, é a forma mais produtiva de ser feliz. Ser honesto, sensível, solidário, apaixonado, sincero e bem-humorado são ótimos atalhos. Não adianta culpar o próximo pelo nosso fracasso e, sim, nos responsabilizar por todas as nossas escolhas. Devemos evitar tudo e todos que nos fazem mal. Ao mesmo tempo, podemos procurar os lugares, cheiros, gostos, abraços e vistas que nos acolhem. A partir do dia 1 de janeiro, nós pintamos o calendário em branco. Basta querermos e lutarmos por um ano colorido e vibrante.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Duas visões sobre o Ocidente: Argo e Rota Irlandesa

A experiência de olhar para nós mesmos e tentar se distanciar do óbvio, dos hábitos viciados e abrir espaço para uma reflexão crítica é algo extremamente difícil. Ainda mais se tratarmos de assuntos polêmicos, como religião, guerra e diferenças culturais marcantes. No entanto, em cartaz nos cinemas, estão dois filmes que possibilitam duas visões distintas das práticas ocidentais em oposição à cultura oriental.

Ao assistir "Argo", de Ben Affleck, o espectador não consegue tirar os olhos das cenas impactantes, com uma reprodução incrível da realidade dos reféns americanos durante a revolução islâmica de Khomeini, em 1979, no Irã. O filme é daqueles de tirar o fôlego, não há tempo de refletir na sala escura, apenas de se angustiar com a situação dos diplomatas estadunidenses que vivem meses em sigilo na casa do embaixador canadense, enquanto toda cidade de Teerã está em ebulição. A operação Argo, que torna-se pública mais tarde, realizada pela CIA, conseguiu resgatar os reféns americanos do Irã em um período que o país disseminava o ódio contra os Estados Unidos, depois da queda do Reinado Xá, que contava com o apoio americano. Com a Revolução Iraniana, de 1979, o modelo autocrático  foi derrubado e o xá recebeu asilo político nos Estados Unidos, presidido por Jimmy Carter, o que gerou uma revolta da população do Irã. Durante a ditadura do xá Mohammad Reza Pahveli, por sua vez, o Irã viveu anos de forte repressão, disseminação da polícia secreta, corrupção e ocidentalização.

Assim, neste contexto em que os iranianos pregavam o antiamericanismo e anti-ocidentalização do país, ocorre a operação Argo. O filme, inicialmente, retoma os anos anteriores à Revolução Iraniana e, de fato, comprova que o regime do xá teve apoio norte-americano. No entanto, no decorrer, os traços orientais são sempre vinculados às práticas violentas e intolerantes, enquanto os americanos são colocados no papel de vítimas de uma sociedade "selvagem", em que não há diálogo e compreensão da diferença. Desta forma, "Argo", apesar de ser perfeito cinematograficamente, é extremamente parcial e superficial na busca da compreensão do embate entre o ocidente e o oriente. O filme não propõe uma reflexão, ele apenas impõe ao espectador que torça para os diplomatas estadunidenses retomarem com vida ao país ocidental, enquanto no Irã ocorrem enforcamentos, grupos armados pelas ruas, fanatismo religioso e perseguição contra os que infringem às leis do Islã. Quem assistir ao filme na expectativa de uma nova oportunidade de conhecer o Irã vai encontrar a mesma lente batida em reportagens de TV, jornais, ou seja, mais uma visão clichê do país.



Do Irã para o Iraque, em contexto muito distinto, "Rota Irlandesa", de Ken Loach, abre espaço para uma reflexão sobre a Guerra do Iraque. O tema é tão atual que não é possível dizer com clareza se o conflito já teve um ponto final. Assim como as dúvidas que existem acerca do início e fim da batalha comandada por George W. Bush, o filme apresenta as incertezas e conflitos internos dos soldados ingleses que foram para a guerra atraídos pelo bom salário em um contexto da crise europeia.

Desta forma, "Rota Irlandesa" já humaniza os soldados de guerra. Aqueles que têm função de combater, atirar, são extremamente humanos, vivem a crise em seu país, o desemprego, além de apresentarem dificuldades em lidar com as atrocidades da guerra. Para complicar ainda mais a situação, um dos amigos, Frankie, morre em situação não esclarecida, o que leva o protagonista Fergus a investigar a morte do companheiro. Para isso, Ken Loach vai fundo nas contradições humanas, em que o poder, as diferenças culturais, a luta por dinheiro, prestígio, a dor e os instintos mais primitivos se misturam em um ambiente hostil, embalado por uma batalha questionável e cruel. Além disso, o filme utiliza imagens reais e documentais do conflito iraniano.

A  perversidade da guerra é refletida com o pano de fundo de uma das estradas mais perigosas de Bagdá. Porém, quem assistir ao filme "Rota Irlandesa" pode chegar a conclusão de que o risco e a violência não existem apenas no Irã e, sim, são condições sine qua non de todos os humanos.


terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Dia de Iansã: a orixá feminista

Hoje é o dia do despertar das mulheres. O dia 4 de dezembro é vermelho vibrante, com uma voz forte, presença intensa de Iansã, Oyá, a orixá feminina que é a encarnação do desejo, da potência, do sentimento. Diante de uma sociedade que mascara o machismo e os rituais de subordinação das mulheres, que permanecem sofrendo desigualdades nos ambientes domésticos e de trabalho, Iansã foge de todas as amarras.

Enquanto na religião católica, a figura feminina é representada pela pureza das santas, a deusa sagrada da Umbanda e Candomblé é indomável, sedutora, provocativa, compra briga, faz trovoar. É impossível conhecer uma mulher de Iansã que não marque presença, que não modifique o ambiente. A deusa guerreira vai para a briga em busca da vitória, não teme nada, no entanto, faz muitos a temerem. Apesar do jeito difícil e pouco maleável, Oyá não perde a sensualidade e conquista o coração de muitos ao redor, o que gera ainda mais insegurança dos outros que não compreendem o tamanho poder de sedução da rainha dos céus.

Atualmente, a ausência de Iansã é percebida no gênero feminino. As mulheres são submetidas a múltiplas violências – a maioria silenciosa - e veem seus movimentos de desejo paralisados, sendo restritas e territorializadas nos papeis de mãe e de esposa. Assim, a mulher acaba habitando a sombra do marido, sendo vista como um objeto de desejo que deve ser conquistado, como alguém que deve seguir um padrão, deve despertar o interesse do homem para, assim, poder se realizar afetivamente. Os homens, por sua vez, sempre ficam no papel de poderosos, que podem escolher as “suas presas”, conquistá-las, usá-las, em uma dinâmica desigual e machista. Neste momento, entra em cena a segurança de Iansã, que não aceita ser subordinada, que cria a situação sem se abalar. As mulheres do dia 4 de dezembro não dependem de homem nenhum, agem sozinha, falam o que pensam, sem se limitar aos padrões sociais.

Em um modelo de sociedade patriarcal, em que o sistema masculino de opressão das mulheres permanece de forma disfarçada, há uma urgência da presença de Iansã. A senhora dos ventos e das tempestades precisa penetrar em todas as mulheres. Com a sua firmeza e valentia, ela consegue defender os seus princípios e seu espaço. Já com a sua doçura, dança e sensualidade natural, Iansã representa uma mulher de personalidade forte, sedutora e atraente. Oyá é feminista e feminina, vaidosa e bruta, doce e valente: é a orixá que expressa a dualidade, a contradição, sem se entregar às convenções.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

O clichê de dezembro

Eu quero que passe logo. Nossa, como esse ano passou rápido! Gente, já é Natal. Até agora não sei o que fazer na virada do ano. Todo mundo vai viajar e eu ainda não planejei nada... Aprenda a organizar seus gastos de fim de ano para não sair no prejuízo...

Nossa, são tantas frases e sentimentos clichês em dezembro que, no terceiro dia do mês, posso dizer que já estou exausta. As pessoas ficam sedentas por atenção, por confraternizações, por uma felicidade inexistente. Não basta viver, temos que compartilhar nossos encontros, as mensagens iguais em todos os anos anteriores, os amigos ocultos das empresas, faculdade, escola etc. Tudo tão repetitivo, rituais que não cansam de ser executados.

Nesta época, até o cinema fica sem graça, com uns filmes mortos, que tentam se dar bem com a proximidade natalina comercial. As lojas te veem como um alvo, os vendedores como um otário que vai engordar as comissões de venda e deixar todos os trocados por aí. Em todo o lugar que se passa, dezembro deixa um desespero, uma reta final cansativa, em que todos saem no tapa para ultrapassar a linha de chegada.

O trânsito representa bem esse sentimento apocalíptico do mês 12. Todo mundo quer andar, chegar logo, mas ninguém consegue sair do lugar. Cada motorista, sozinho no seu carro, deseja driblar todos ao seu redor, porém, não conseguem nem olhar para o lado e aproveitar a música no rádio, a bela criança que insiste em gargalhar no meio da rua, reconhecer o amigo de infância que está no carro ao lado... Nada disso importa, afinal, são tantos eventos ao mesmo tempo, tantos encontros marcados na agenda, que não há tempo para apreciar a vida.

Dezembro é o mês da geladeira, de consumir todos os alimentos que foram guardados o ano inteiro e estão prestes a vencer. É o mês da balança, em que você revive em sua cabeça tudo o que fez e deixou de fazer durante o ano inteiro e se cobra a cumprir todas as metas ignoradas em menos de quatro semanas. Além disso, você é obrigado a conviver com um calor fenomenal, que mistura a tensão, a correria com um tempoquepassarápidodemais, mas nunca o suficiente para livrar todos nós dessa agonia que só acaba com o início de janeiro.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

O Palhaço

Nunca gostei de palhaço. Na infância, evitava o circo, pois temia encontrar aquele ser tão obrigado a ser feliz. Aquela felicidade maquiada em forma de batom vermelho, que cobria não só a boca inteira, como quase todo o rosto, me deixava extremamente angustiada. O palhaço, com a obrigação de fazer rir, me assombrava. A tinta branca na cara, o nariz, a roupa, tudo... tão artificial... Porém, sei que nunca havia conseguido ver um palhaço de verdade. Apenas nas telas do cinema tive a oportunidade.

Na sala escura, o palhaço é bem mais verdadeiro e transparente do que no picadeiro. A primeira vez que assisti ao filme de Selton Mello fiquei paralisada. Não sei ao certo o que mexeu aqui dentro, no entanto, reconheci que algo tinha mudado.

Já na segunda vez, percebi que o pânico do palhaço havia se transformado em uma sincera identificação, compreensão e, até mesmo, solidariedade. Como alguém consegue fazer rir quando ninguém o enxerga? Como ser feliz sendo obrigado a abandonar a dualidade da melancolia, da tristeza, da incompreensão? Impossível. Concordo que existem pessoas que nascem predestinadas a atuarem no circo, entretanto, ninguém nasceu para ser palhaço, para viver o dia inteiro sorrindo.

No filme, Benjamin é o palhaço melancólico Pangaré. São dois opostos unidos em um mesmo personagem, ator, diretor. Todos os sonhos de um ser humano estão ali. As cores ficam restritas ao palco, assim como as piadas prontas, o sorriso forçado. Já do outro lado da lona, Benjamin é mais um homem que sonha com uma outra realidade, que encontra a dúvida, a depressão e a tentativa de superar a dor como barreiras para sua vida pessoal e profissional. Os excessos, os dramas do palco transformam-se em uma rotina sem perspectiva e dura.

Benjamin busca ar, sair sem rumo, em busca de um amor improvável, platônico, que encontrou na sua trajetória de artista. Ele vive perseguido pelo desejo de ventilação. Quanto mais ele tenta sabotar essa vontade de mudança, mais ele se paralisa. Assim, o palhaço percebe que precisa assumir sua característica humana e vencer os medos embarcando no seu próprio rumo. Longe dos palcos, ele vai em sua estrada, no interior de Minas, e esquece sua felicidade aprisionada. Ao exibir sua melancolia, ele, finalmente, consegue encontrar os objetos mais importantes de sua história: sua identidade e seu ventila(a)dor.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Era uma vez eu, Verônica

Toda mulher é Verônica. Não mira, mas acerta no peito. Às vezes, em nosso próprio peito. Despido ou não. Coberto de branco, com jaleco, que esconde o corpo, mas exibe a ternura. O desejo é deixado de lado na hora do expediente de psiquiatra, de filha. Na hora vaga, ele não pede licença e não perde o charme. O desejo em carne, em corpo, com seios à mostra, sem parecer vulgar.

Era uma vez eu, em Recife, Verônica. Cidade de Karina. De cor, de música, de mar, frevo diariamente, antes, durante e depois do carnaval. Na vitrola, de preferência. Na pausa entre a casa e o hospital, todo mundo merece ser Verônica. Ter o direito de duvidar, de escolher e de voltar atrás no seu próprio caminho. Tirar todas as roupas e pedras que nos conduzem a uma direção.

Neste momento de reflexão é possível se deparar com a solidão. Mas, aí, surge o mar, esconderijo para os mais impuros segredos, as ladeiras de Olinda, com seus amores livres, vazios e repletos de paixão. O melhor a se fazer é não parar, seguir adiante, em busca da desconstrução.

Não importa se todos ao redor estão paralisados em seu próprio ritmo contínuo. Cada Verônica reconhece o seu próprio tempo; precisa fazer as escolhas no momento certo. Sem julgar os outros, toda Verônica quer se reconhecer e conhecer a fundo. Rir e sorrir da vida, com uma cerveja na mesa, fugindo do esquema "tá tudo padronizado", com os olhos borrados de purpurina, brilho na pele de sol do nordeste, do mar de Recife, boiando nas águas claras.

Era uma vez uma mulher. Filha, profissional, médica, paciente, amiga, humana. Uma mulher de Recife, que vive espremida entre os prédios, carros e praia. Ela vive a doçura e a sexualidade, ela vibra, respira, nada, goza. Verônica dribla a dor através da compreensão, foge dos julgamentos, olha nos olhos, aguenta um cuspe da sociedade. Sente a dor, não paralisa, cicatriza, segue em frente - firme e forte - no processo de libertação.

http://www.youtube.com/watch?v=CRUDW05w6cY&feature=related

A saudade

De vez em quando aparecem coisas belas no facebook. O jornalista Rodrigo de Almeida postou algo que me comoveu:

A SAUDADE

Saudade é o filho estar a 400km e cinco dias de distância. E só poder tocá-lo por afeto e memória.

A saudade brilha sozinha no começo de todas as ausências.

Leonardo Coimbra: A saudade é o peso do corpo magoando a delicadeza da alma.

Clarice Lispector: Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida.

Eduardo Lourenço: A saudade, a nostalgia ou a melancolia são modulações da nossa relação de seres de memória e sensibilidade com o tempo.

Neruda: Saudade é amar um passado que ainda não passou, / É recusar um presente que nos machuca,/ É não ver o futuro que nos convida...

Guimarães Rosa: Saudade é ser, depois de ter.

Chico Buarque: Saudade é o pior tormento, é pior do que o esquecimento, é pior do que se entrevar.

Fernando Pessoa: Sinto uma saudade imensa de uma futuro melhor.





Como pode essa palavra que existe apenas na nossa língua portuguesa expressar o sentimento de um mundo? A saudade consegue ser a presença e ausência simultaneamente. Existe tanta dificuldade em descrevê-la que ela, simplesmente, não existe nos outros idiomas. É muito além de um "I miss you". Não é falta, é completude de vida. Uma mistura de nostalgia com realização. Tempo que passou, mas permanece eternamente. É o apego à vida, às conquistas, aos nossos amores. A saudade é o toque permanente do passado na porta do presente.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Literatura - apenas - para as UPPs: da FLUPP para Cinco vezes Pacificação

O que seria uma Feira Literária Internacional das Unidades de Polícia Pacificadora (FLUPP)? Provavelmente, você recebeu algum e-mail, comentário, matéria ou anúncio desse evento na última semana. No início, sem me tocar sobre o significado da sigla FLUPP, achei interessante a proposta de difundir o hábito literário. Porém, depois de refletir, não encontrei nenhum sentido neste projeto: o que seria uma feira internacional das UPPs?

Como a ideia de promover a literatura pode ser tão restritiva a ponto de escancarar o limite no próprio nome? O livro, como um passaporte para a liberdade, que nos livra das correntes de fronteiras, não deveria ser relacionado com um evento que tem território demarcado. As palavras e autores não podem subir os morros pacificados e deixar os outros "em guerra" abandonados. Pelo visto, a mídia concorda com a proposta da FLUPP, pois fazia tempo que o livro, a matéria-prima tão esquecida, não recebia tanto espaço em jornais impressos e na TV. O evento ganhou espaço em todos os veículos, inclusive, em uma matéria sobre a próxima edição (precoce, não?). Sem dúvida, Ariano Suassuna, Ferreira Gullar e outras atrações merecem todo o espaço na imprensa, porém, não podemos ser ingênuos em acreditar que eles foram os protagonistas desta FLUPP. A polícia pacificadora, que gere esse modelo de paz que não compreendo, é quem fez a festa. As UPPs são um modelo de cidade-maquiagem que a mídia não só compra, como compartilha, curte e vende.

Mesmo para quem acredita que as Unidades de Polícia Pacificadora são capazes de garantir a segurança pública, qual o motivo de um evento literário ser restrito a apenas essas comunidades? As favelas "pacificadas" merecem ter acesso à literatura, assim como todas as outras favelas, ruas, bairros, cidades, estados... Literatura é porta aberta, queda das cercas, muros e limites. Literatura é guerra, é poesia, é amor, é dureza, é viagem. Difícil dizer o que é literatura. Muito mais fácil concluir o que ela - de fato - não representa e nunca representará: uma Unidade de Polícia Pacificadora. O livro não é polícia, ele é uma arma para a transgressão, para a loucura, encontro, desencontros, questionamento. O livro não é unidade, ele é conjunto de palavras, de perdição, de significados, de sentidos, angústias e incompreensões.

Depois de tanto procurar e não encontrar o sentido da FLUPP - aliás que sigla infeliz, assim como a proposta e o nome do evento -, me deparo com a notícia de que vai estrear no cinema o filme "5 vezes pacificação". Juro que demorei para tomar coragem e cuspir as palavras de crítica contra esta Feira Literária... agora, surge outra novidade que me faz tremer nas bases. Bom, posso dizer que, inicialmente, não pretendo assistir ao filme por ele me parecer absolutamente desinteressante e clichê. Porém, mais tarde, tenho certeza que farei questão de assistir e continuar a buscar sentido nesta "pacificação" desordenada. Como já dizia Caetano, "alguma coisa está fora da ordem". Ou esta mania chata de desconfiar e de criticar está ultrapassada ou esse papo de pacificação já está pra lá de Marrakesh.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Moonrise Kingdom

Como a beleza consegue ser essencialmente triste? Em tons pastéis, figurinos impecáveis, maquiagem propositalmente manchada por um azul profundo. Um filme inevitavelmente perfeito. São quadros, enquadramentos, paisagens, ilha, mar, grama. Tudo vibra em um constante tempo, que não passa, que repassa as tradições, que expõe o limite encravado no peito rodeado pelo oceano.

Há um cronômetro que desperta aqueles escoteiros predestinados a conviver com a melancolia da rotina. O dia é limitado por apitos ensurdecedores, já a noite nunca chega: ela habita cada um do universo. A escuridão não consegue se calar diante da beleza da arte, da casa de bonecas, de uma ilha com paisagens fenomenais. Nada, ali, passa de um vício, dos rituais humanos de se restringirem aos seus próprios fantasmas, de se prenderem em suas dificuldades, temendo o novo.

Seria um teatro ou um filme? A dor extrapola o laranja quente das telas. O amarelo apreende o olhar do espectador e prende os jovens Sam e Suzy. A saúde dos personagens é expressa, justamente, na inadequação. A loucura, a impossibilidade de conviver, o desespero pela fuga para uma ilha dali distante. Para que existem os estudos de cartografia se eles são limitados às fronteiras geográficas? A geografia não basta. É preciso construir linhas imaginárias, novas composições, novas cores que manchem aquele tom insistentemente amarelado e empoeirado por tradições perdidas.

A agressividade de Suzy é a barreira para uma sociedade que insiste em se acomodar, esconder suas frustrações para não exibir suas feridas mais profundas. Cada um, ali, se recusa a reconhecer a fragilidade das relações, que sobrevivem graças às instituições falidas, ao estado de alerta que proíbe que a situação fuja ao controle. Porém, nada pode deter a loucura, logo ela, expressa nos dois jovens apaixonados, dispostos a escancarar todos os podres, colocando a faca no peito da hipocrisia de uma sociedade medíocre.

Por ironia, Sam, o jovem sem família, odiado e repudiado por todos que são amarrados em convenções, tem a brilhante ideia de partir para uma nova dimensão, rodeada de mar, de esperança, de crise existencial. Ele não admite o comodismo, ele busca o novo, encara a dor. Consegue, por tabela, reunir toda a agressividade latejante de Suzy e partir sem rumo. O que eles buscam não está no mapa, não está na ilha. Pode ser encontrado após o dilúvio, mas – sem dúvidas -, com muita dificuldade. As barreiras do tempo que levam à vida adulta são amarras de todos. Quem sabe, um dia, o jovem casal consiga, em seu crescimento individual, se desfazer de tudo aquilo que os cerca e se perder no mar.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Os intocáveis - Viva Driss!

Se eu pudesse escolher uma coisa para fazer nas horas vagas, apontaria sem titubear: ir ao cinema. Sou simplesmente fascinada pela sala escura, meu quintal de casa, onde aposento a vaidade, ignoro conhecidos, esqueço a maquiagem e, às vezes, assumo a carioquice com minhas havaianas.

Não tenho regras para ir ao cinema, vou sempre que me der na telha, uma, duas, três vezes por semana. Às vezes, não gosto de ler nada sobre o filme para evitar ser contaminada pelo olhar crítico dos outros. Frequentemente, chego a conclusão que sou fã do cinema francês. Sem parecer pedante, conhecedora, cinéfila, mas praticamente todos os últimos bons filmes que assisti vieram da França. Assim, acabo sendo convencida logo que estreia um filme daquela terra.

Entretanto, não costumo gostar do gênero "comédia". Tenho o receio de me deparar com um humor pastelão. "Os intocáveis" era descrito como comédia, o que já ganhara minha desconfiança. Porém, não tinha lido mais nada a respeito. Caí, no domingo à noite, na sala de cinema de paraquedas. Era o horário possível, próximo a minha casa, em um domingo entediante e abafado. Pronto, ali iria passar minha hora vaga.

Para me animar antes da sessão, minha irmã chegou a dizer que o tema me interessaria, pois tratava do problema social vivido por Driss, um imigrante vindo do Senegal, ex-presidiário, e morador do banlieue parisiense. Dramática assumida, imaginei uma espécie de "As neves de Kilimanjaro" 2, e adorei a ideia.

Estava completamente errada na minha previsão, comparação absurda. "Os intocáveis" não é dramático. É Driss, colorido, simpático, impulsivo, aberto, politicamente incorreto, pragmático e, no tempo que sobra, sensível. A comédia não é forçada: nada de piadas prontas, diálogos manjados e, ao mesmo tempo, nada de extraordinário: um roteiro simples, com poucos personagens, mas todos grandiosos. A tela é toda do Driss, o senegalês, francês, metido a moralista, com princípios, humor sedutor, sorriso esplendoroso. Eu, que costumo estudar e ver o tema de imigração com uma carga pesada, me surpreendi ainda mais com esse personagem. Ele não representa as dificuldades dos imigrantes na Europa, ele não transparece os problemas e angústias dos seres humanos no mundo: ele é a solução para tanto drama. A partir de agora, virei fã assumida de comédias.

domingo, 21 de outubro de 2012

Sonhando em polonês

Nem em sonho
imaginava visitar
a Polônia

Mas na madrugada
de domingo
estava eu achada
nas Montanhas Tatra.
Sabia muito mais
sobre a terra
do que imaginava
antes se restringir
ao Pacto de Varsóvia

Acordava para o mundo
dos polacos.
Ali, estava em casa,
no país gélido em meados
do inverno fevereiro.

A minha cama
não existia,
falava uma língua
que nunca tinha ouvido.
Tentava a sorte com o inglês,
pois ninguém do outro lado
do quarto, em plena noite sombria,
além de mim,
se comunicava em polonês.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Uma reflexão pelo fim do trote


É impossível participar de todas as lutas e defender todas bandeiras que gostaria. Também sou incapaz de brigar pela transformação de tantos atos e hábitos perversos da humanidade... aliás, são tantos estes, que, muitos acabam passando por despercebido. Porém, um veio à tona hoje de manhã: deparei-me com um desabafo de um grande mestre sobre o hábito do trote estudantil. Este professor, que marcou minha vida acadêmica, questionava o fato de ver os "calouros" nas ruas pedindo dinheiro, chamando a atenção para os "dias difíceis". Fui pesquisar e encontrei a seguinte descrição: "trote" possui correspondentes em vários idiomas, como trote (espanhol), trotto(italiano), trot (francês), trot (inglês) e trotten (alemão). Em todos estes idiomas, o termo se refere a uma certa forma de se movimentar dos cavalos, uma andadura que se situa entre o passo e o galope. Todavia, deve ser lembrado que o trote não é uma andadura normal e habitual do cavalo, mas algo que deve ser ensinado a ele (muitas vezes à base de chicotadas e esporadas)

Neste momento, refleti sobre o quanto essa tradição de ingresso na vida universitária pode ser perversa para os jovens e adultos. Passei por três graduações em diferentes universidades, assim, presenciei - também - três semanas de calouro. Em todas as faculdades - UERJ, PUC-Rio e UFRJ - fui testemunha das semanas de "calouro". Lembro que a primeira vez que pisei em uma sala de aula, na UERJ, já temia o tão falado trote, pois amigos e familiares já haviam me prevenido sobre as brincadeiras, competições etc. Eu, tímida, como era, cheguei atrasada propositalmente para ver se conseguia fugir desta prova de fogo, mas, assim que fui reconhecida como novata na área, fui eleita a "caloura patricinha" e tive que fazer uma declaração de amor a um veterano, além de pressionada a beijá-lo (claro que me recusei!). Aquilo foi tão constrangedor, que, simplesmente, resolvi apagar da minha memória por um tempo. No entanto, hoje, essa indignação que senti no primeiro dia do curso de Ciências Sociais voltou com toda a força. Os gritos dos “poderosos veteranos” de beija-beija e as gargalhadas de todos ao redor encheram o meu coração de revolta. No período, a timidez me impediu de expor essa história, mas hoje faço um apelo para que as pessoas reflitam sobre o sentido do trote.

Muitos já tentaram me convencer que é uma brincadeira, que ninguém é obrigado a participar, que serve apenas como social, que “os melhores amigos da faculdade são conhecidos no trote”... Enfim, nenhum destes argumentos conseguiu me convencer. Na PUC-Rio, no ano que entrei, o trote não foi tão “pesado”, pois o reitor havia proibido o hábito depois de um aluno passar mal durante a “semana da calourada” do curso de Engenharia. Mesmo assim, lembro de ter presenciado a cena de uma veterana jogando tinta no “cofrinho” de uma caloura desatenta.

Seis anos depois, na última (espero eu!) graduação, de Direito na UFRJ, simplesmente não apareci na primeira semana de aula. Imaginei que os dias de trote seriam os mesmos que já conhecia. As brincadeiras de “choquete”, de expor a lingerie por cima da roupa, colocar a camisinha em uma banana, além dos “tradicionais” banhos de tinta e pedido de dinheiro na rua – de fato – permanecem como tradição no trote. Os colegas de classe relataram as histórias, muitos achando graça, outros com constrangimento. Uma das meninas, por ser considerada bonita pela veterana, foi perseguida e apelidada de forma machista.

O tempo passou, o local de estudo mudou, o curso é outro, mas o mau-gosto e desrespeito com os estudantes continuam. O pior de tudo: a prática é propagada pelas próprias vítimas das brincadeiras. A mesma pessoa que, um dia, é levada em coma alcoólico para o hospital após as provas, está, no período seguinte, comandando a comissão de trote. Os outros incomodados, como eu, acabam se calando. Assim, depois de anos de silêncio sobre o assunto, e, alguma experiência nas costas, peço a todos uma reflexão sobre este ritual de inserção no meio acadêmico. Será que não existe outra forma de se integrar na universidade? O que seria essa “social”, onde uns são considerados melhores e piores do que os outros, a humilhação é regra, assim como a banalização da sexualidade e o desrespeito com as mulheres? Quem não aceita o rótulo de calouro é taxado como antissocial e arrogante porque não está disposto a obedecer às ordens de outro estudante que está com a “pulseira” de organização do trote e ainda é ameaçado a “ser marcado na faculdade” e ser proibido de ir em todas as chopadas. Para mim, seria um alívio não ser nem convidada para este tipo de evento, mas isso não acontece com todos. Acredito – muito – que os cientistas sociais, os jornalistas e advogados, assim como os demais profissionais, são capazes de criar formas mais interessantes de celebração da entrada no mundo universitário. Também tenho certeza que deixar de ser pintado de tinta e evitar a exposição ao ridículo irá fazer bem para todos. As amizades, também, não sentirão falta deste ritual um tanto tirânico. Está mais do que na hora de abandonarmos esta tradição vexatória.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Campo de Santana

Era um campo bem verde, com aquela grama molhada de amarelo nas pontas. Uma grama que fazia nossa perna coçar ao se deparar com a mais pura forma de natureza. Era um parque esquecido no meio de uma grande cidade. Quando foi lembrado, ele estava ali, belo como sempre, com seu excesso de mata, de tranquilidade e de sobrevoos de pássaros, além de sua mistura de bichos, como cotias, pavões, gatos e cachorros.

Nos dias de semana, o parque era habitado por moradores de ruas e meninos viciados em drogas. Quem passava por ali tinha muita pressa: segurava seus pertences com toda força do mundo, caminhava em passos rígidos para atravessar o abandonado Campo de Santana.

No entanto, no sábado, foi possível presenciar uma cena diferente. Muitas cangas, toalhas e papéis improvisados serviam de repouso aos diferentes tipos de pessoas que buscavam seu lugar na sombra para assistir ao belo espetáculo da Intrépida Trupe. As crianças se debruçavam no cenário, que mais parecia uma instalação infantil em perfeita harmonia com aquele espaçoso gramado. Os artistas se sobressaiam, em tons laranjas, rosas e amarelos, com suas piruetas, danças, coreografias e expressões.

A beleza do Campo esquecido era completa com a arte em suas diversas expressões. Tudo ali era vibrante. O canto dos pássaros lutava com a trilha sonora do espetáculo, em um maravilhoso combate. Os artistas habitavam uma casa com muitas armadilhas: passavam por camas no teto, ferros, se equilibravam no cenário, onde o chão era a grama, a vida em forma de verde. Ali, no escondido Campo de Santana, a arte e a vida se instalaram e provaram que o abandono, o esquecimento e a violência não vão superar a naturalidade das coisas: aquele gramado não é palco de medo, ele é, sim, um habitat natural das crianças, da dança, da família, dos pássaros, da acrobacia, dos artistas, das cotias e, é claro, da vida.

domingo, 25 de março de 2012

Pina 3D


Arte e cidade se complementam
e transbordam sentimentos.

Quando falta palavra,
há dança e
expressão dramática.

Quando tudo parece perdido,
a procura permanece.
Não importa o rumo,
e, sim, a necessidade 
de busca e de construção.

Nada é certo ou errado,
tudo é loucura à flor da pele.
Excessos de drama e de leveza.
Peles que exalam 
os mais intensos cheiros.
Corpos que se deparam
com grandes abismos.

Terra, água, pedra...
Todos os elementos reunidos.
O ser humano precisa superá-los,
atravessar as armadilhas,
os perigos, os desastres,
o labirinto das próprias mentes,
a timidez que insiste em permanecer.

Só na superação e na eterna busca
encontra-se o caminho da dança.
Neste ponto, enfim, nos deparamos com a vida. 

sábado, 24 de março de 2012

Habemus Papam


A multidão precisa de alguém para confiar. Por não saberem o caminho a seguir, todos preferem depositar a sua insegurança em um líder que transmita força e estabilidade, que transforme as dúvidas em certeza, a ausência de convicção em fé.

Entretanto, quem há de querer assumir toda essa responsabilidade? Existe alguém que possa servir de guia para uma massa desacreditada e incorporar a figura de santidade mais próxima de Deus? Não há candidatos para esta dura tarefa, assim, cabe aos cardeais a escolha do próximo papa.

Esta votação, por mais justa que possa ser, transforma-se em uma cruel imposição ao eleito. Ele não tem chance de se esquivar, de escancarar seus medos, seus sonhos e, o pior, deve camuflar todas as suas inseguranças, para poder, desta forma, acalentar a multidão que o espera, como um rebanho de ovelhas que depende do seu pastor para sair do lugar.

Nesta obrigação de ser líder, ele se desespera. Percebe o quanto se aprisionou em sua própria vida. O quanto a presença de Deus e de todos os cardeais o tornava refém da solidão e de um déficit de acolhimento. A massa de pessoas de todas as partes do mundo o deixava transtornado, afinal, nada tinha a dizer a eles, a não ser que pudesse se abrir e expurgar todos os medos.

Deus havia determinado que ele deveria ser o próximo papa, porém, sua intenção não era essa. Ele queria estar nos palcos, em uma peça de teatro, longe dos fiéis e de toda a vestimenta, que mais parecia um peso. Mesmo correndo o risco de não ser perdoado pela divindade e pelos colegas, ele resolveu seguir o seu desejo - sempre reprimido - pela primeira vez na vida: virou as costas para a multidão, deu adeus ao Vaticano e se libertou das correntes. Concluiu que não nasceu para liderar e, sim, para seguir suas próprias vontades.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Insônia

De dia, os problemas descansam.
À noite, não me deixam descansar.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Verdinha

Seu apelido era Verdinha. Nunca gostou de ser chamada assim, entretanto, nunca fez questão de abandonar o hábito de só usar roupa verde, motivo pelo qual foi apelidada.

O armário da jovem parecia uma floresta, com roupas de diferentes tons da mesmíssima cor. Abrir as suas portas era como penetrar no meio da mata, sentir a variedade de texturas das folhas, observar o caule e a raiz de cada uma. Para não perder muito tempo se arrumando, era mais fácil optar pela primeira camiseta que via na frente, evitando entrar no labirinto da floresta em pleno quarto.

Nunca, desde que começou a escolher as suas próprias roupas, se vestiu de outra cor. As recordações de fotos e vídeos de quando era criança pareciam montagem, afinal, quem seria aquela menina com um vestido branco ou rosa? Ela mesmo não se reconhecia.

Na rua, os seus amigos só a chamavam de Verdinha. E sua fama se espalhava por todos os lugares. No entanto, uma pessoa não se conformava com a mesmice das roupas da jovem: sua mãe. Todos os dias, o modelito era motivo de briga, afinal, "o que pensariam todos ao redor?! Que você tem apenas uma roupa!", gritava a dona da casa. A filha fingia que não ouvia e saia com um pedaço da floresta em seu corpo.

Porém, uma manhã, na hora de se arrumar, Verdinha abriu o seu armário e foi surpreendida pelo desmatamento total: não havia mais nenhuma peça de roupa! Ou melhor, havia várias, mas todas novas, das cores mais variadas possíveis, nenhuma verde. Sem saber o que fazer, a jovem começou a gritar pela mãe, que não estava em casa. Assim, ficou completamente desesperada, perdida, sem saber como faria para sair de seu quarto.

Verdinha foi obrigada a escolher uma daquelas roupas novas para ir em busca da mãe. Optou por uma peça azul, o tom que mais se aproximava do verde. No entanto, continuou em estado de choque, não conseguia se enxergar no espelho, não foi capaz de caminhar com a roupa e, muito menos, de sair de casa.

A raiz fora cortada, junto com todos os galhos e folhas. Verdinha estava desolada, perguntava-se onde foi parar toda sua mata. Depois de muito choro, ela percebeu que era apenas mais uma árvore da floresta que havia sido derrubada. Agora, havia se transformado em um galho murcho, sem vida, resquício de toda destruição.

terça-feira, 20 de março de 2012

O fim da xenofobia e de outros preconceitos


Nós somos bichos... Aliás, nem isso somos. Os bichos não são capazes de fazer o que os homens fazem, ainda mais, com os seus iguais. Quem é capaz de matar, destratar, humilhar o seu diferente não percebe o quanto é pequeno diante do mundo.

Óh, ser tão pobre, superficial, desprezível, repugnante, ignorante. Não percebe que o mundo é de todos. Gigantesco, o globo azul guarda as singularidades de cada um, de cada povo, etnia, religião. Cultura, gênero, cor da pele, nacionalidade, nada disso importa. Não há fronteira, ou, pelo menos, não deveria haver. As grades devem ser extintas, deveríamos escolher onde desejamos fincar nossa vida.

Quem não enxerga a imensidão da natureza, da humanidade, do sentimento de fraternidade há um dia de ser esmagado por uma massa, uma comunidade internacional, de todas as cores e tipos, que, em um coro, em uma única vibração intensa, irá expurgar todo o preconceito, intolerância e xenofobia do mundo. Só assim as linhas imaginárias das fronteiras, dos limites, irão se acabar... junto com toda a podridão dos humanos que insiste em permanecer.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Paixão adolescente

Era um casal estranho. Ela não abria a boca nem para dizer "olá". Ele, por sua vez, acabara de chegar ao Brasil, falava com um sotaque francês engraçado. Também era visivelmente tímido, até sua própria postura curvada o entregava.

Eles mal se cumprimentavam durante a hora das aulas. Se cruzavam, os olhares se encontravam, imploravam uma aproximação... No entanto, os dois se travavam e não permitiam viver aquela sintonia total de uma paixão adolescente. Todos ao redor percebiam que ali haveria uma história. Porém, o que havia - de fato - eram tchauzinhos de longe e um aceno reticente.

Um dia, os dois se encontraram em uma roda de samba. Sim, apesar de serem tímidos, os dois gostavam do ambiente regado à música e à cerveja. Quando um notou a presença do outro, criou-se um constrangimento: uma chama interna, uma felicidade contagiante, um nervosismo enorme. Todos os sentimentos, ao mesmo tempo, de maneira intensa.

Os olhares de longe estavam incomodando todos. Alguns tinham vontade de empurrá-los contra a parede; outros de, simplesmente, convidar um deles para se aproximar do outro. Depois de muitos minutos, ele tomou coragem. Se aproximou da moça, que estava sentada com suas amigas. Educadamente, disse: "Posso conversar com você?". Ela fez-se de desentendida e levantou.

Os dois, finalmente, ficaram juntos. De longe, parecia um casal perfeito, com química de sobra. Entretanto, nunca mais se uniram. Talvez, a timidez ou o medo da entrega os afastaram de vez. Poderia ser também o destino, que insistia na separação, afinal, paixão adolescente parece com o carnaval... Depois de um tempo vira cinza.

As marcas

Eu posso, sim, me lembrar
No entanto, o que desejo é esquecer
O esquecimento seletivo
é meu ideal.

Simplesmente apagar 
da minha vida
todas as pessoas
que sonhei não conhecer.

Apagar as dores, mágoas e frustrações...
Os pensamentos negativos, 
o rancor...
tudo isso irei abandonar.
Mas as marcas... 
Estas, sim,
vou carregar para sempre.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Irmã

Tem mais coisa
que canto.
Aperto demais
para pequeno espaço.

Mais diferença
do que afeto.
Muita mágoa,
pouca sinceridade.

Cobranças eternas...
não há irmandade.
Laços estreitos...
rompidos por um penhasco.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Mãe

Bolsas profundas
ao redor dos olhos
um cansaço visível
entre as pálpebras
quase fechadas.

Uma garra determinante
em momentos de crise,
sempre disfarçando a água
que insiste em rolar
toda vez que vê um filho no chão.

Recordava dos tempos
de gravidez, de início de maternidade.
"Quando crianças nunca deram trabalho,
sempre foram um anjo", se orgulhava.

No entanto, hoje,
ela fugia do trabalho
para os socorrer.
Entregava a eles
a última gota de suor do dia,
os cedia a solitária
nota de dinheiro
de uma carteira vazia.
Continuava o expediente
ao lado dos filhos.
Isso, sim, era trabalho de verdade.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Do lado de fora

Ei, vem pra vida!
Aqui, do outro lado,
da janela azul,
tudo é mais bonito.

as paredes não são brancas,
aliás, não existem paredes.
o chão não é de madeira,
ele muda a todo momento.

há buracos, mas é só você ficar atento.
existem armadilhas que podem ser esquivadas.
Também é preciso cuidado
com a indelicadeza e maldade,
que estão à solta.

Mas, pode ter certeza:
existem paisagens, cheiros,
cantos, pessoas e sons
que fazem a vida valer a pena.

As mulheres do sexto andar


No sexto andar há cores e flores de todos os tipos, formas, idades. Muitas mulheres, em seus contornos, muita vitalidade. Força, garra... pra encarar a vida sem esquecer a risada de todo dia.Não há espaço para se amargurar com os problemas que as cercam. Todas ficam em pequenos quartos e dividem um banheiro, mas nada as impedem de brindar à vida diariamente.

O encontro da beleza com a vida contrasta com a pouca infraestrutura daquele velho e abandonado sexto andar. A sujeira que poderia repelir transforma-se em união, em luta. Elas limpam as casas, banheiros e quartos da alta sociedade francesa, mas convivem com a desordem da área destinada às domésticas. Entretanto, nada disso as tornam amarguradas ou infelizes.

O salário modesto, que poderia deixar a rotina complexa e difícil, não é impedimento para nada. Todas são pessoas simples e leves ao se olharem no espelho, porém, o reflexo não esconde o drama e intensidade de tudo que elas vivem.

As diferenças e peculiaridades de cada mulher não tornam-se barreiras e, sim, um impulso para a aproximação. Todas têm um lado Maria de ser: mãe, amiga, mulher, trabalhadora e, sempre, sonhadora. Muitos as olham e pensam: "como são corajosas"... Mas eu acredito: corajoso - de fato - é quem sai do sexto andar.

terça-feira, 13 de março de 2012

Palavra em fuga

Ela teimava em sair. Palavra fugida, perdida em alguns anos de abandono de si mesma. Logo ela, que sempre escreveu a galope, rápida, certeira. Hoje, ficava horas e horas em frente a uma tela em branco... e só vinha bobagem.Palavras e frases desconexas. Um apelo emocional clichê. Nada de interessante.

Percebeu que os anos de esquecimento, em que se abrigou em uma gruta distante de todos os sentimentos e reflexões, foram fundamentais para a perda da prática da escrita. Afinal, os poemas e contos só vêm aos que o procuram, em uma vida, repleta de construção e desconstrução, narrada pelas palavras.

sexta-feira, 9 de março de 2012

"A noite estrelada", de Van Gogh


Era início de uma noite de sexta-feira de uma Nova York congelante. A temperatura estava entre 5 e 7 graus negativos. Nos arredores da rua 53 havia um calor humano, em uma fila que virava o quarteirão à espera da entrada gratuita em um dos principais museus do mundo, o MoMA.

Aos poucos, os seguranças distribuiam as senhas de entrada e, conforme, as pessoas adentravam o belo prédio, todos iam a caminho do quarto andar. Uma procissão subia as escadas, outra parcela esperava o elevador. Alguns, com o mapa em mãos, já estavam prevenidos e sabiam - exatamente - para onde gostariam de ir. Mesmo sem marcar encontro, todos se chocaram no mesmo lugar: em frente ao quadro "A noite estrelada", de Van Gogh.

Uma multidão estava ali, era o point do museu. Todos queriam presenciar a obra de arte; alguns faziam questão de seu momento ilustre ao lado de Van Gogh; outros não perdiam um ângulo do quadro e não davam descanso à máquina fotográfica.

E os outros quadros ficavam ali, meio perdidos, esperando um pouco de atenção. Afinal, todos têm seu êxito, sua perfeição, seu questionamento. Não é à toa que estão expostos no MoMA. Artistas como Frida Khalo, Pablo Picasso, Mark Rothko, Vincent Monet, Henri Matisse, Gustav Klimt, Marc Chagall e outra eternidade de gênios também estão nas galerias do museu.

Entretanto, inexplicavelmente, a multidão insistia em permanecer em frente à obra de Van Gogh. Talvez, aquela imagem esteja presente no inconsciente do público; a popularidade da obra faz com que todos tenham a necessidade de conferir se, de fato, ela existe. O real motivo que leva milhares de pessoas a marcarem lugar e a fazerem hora em frente ao quadro é desconhecido. A única certeza que se tem é que os aquecedores do museu não fazem nenhum efeito comparados ao calor do metro quadrado mais disputado de Nova York.

Cidade cosmopolita

Este mundo tão grande
ao meu redor
me faz lembrar
o quanto meu mundo é pequeno.

Quando sou jogada
pro palco gigante
me perco
e acabo me encontrando
no meio de tanta diferença.

Eu me reconheço
em todos os tipos
gentes, cores, cabelos e religiões.

Gostaria de guardar
um pouco de cada um
em mim.
quero levar a imensidão
do mundo
para minha
mínima realidade.

Quero transbordá-la,
enchê-la de imagens,
de sons, de outros.
Quero crescer minha vida.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Mulher de aquário

O que mais me lembra você?
Cores, lenços e flores.
Aquele abraço que cabe o mundo,
a sala lotada de quadros,
fitas, pinturas, cacarecos, fotografias...

A falta de espaço a ser preenchido
O olhar que decifra tudo
antes mesmo de eu falar.

A risada escrachada,
que me chama de palhaça,
sem jamais me humilhar.

quarta-feira, 7 de março de 2012

uma tarde na Macy´s

Quase sempre
ela não se enxerga
na multidão.

Invisível,
senta-se na escada.
Todos a atropelam,
enquanto ela observa o mundo
do qual não faz parte.

O mundo a engole,
a enlouquece.
Um vai e vem constante,
muitas luzes, sacolas,
pessoas que anseiam pelo consumo.

Todos sorrindo em busca
de algo que necessitam
para camuflar toda a angústia
que carregam.

Enchem de maquiagem,
de sorrisos e compras,
ausência de naturalidade
e de pausa pra reflexão.

O tempo...
os passos não param
Tudo é preciso pra escapar da solidão.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

A relação com uma adolescente

Adolescência é aquela fase que a gente torce pra passar logo, na verdade, o mais rápido possível, a ponto de esquecer que ela, um dia, existiu.

Quando somos "brindados" por um adolescente em casa podemos nos considerar com uma missão diária de paciência, capacidade de ignorar, de aturar e, é claro, de dar bons conselhos, que, obviamente, serão ironizados.

A agressividade de um adolescente pode chegar a níveis absolutamente fora do controle. Quando contrariado, este ser exibe doses altíssimas de perversidade, que o incitam a humilhar, a levar a ira à pessoa mais próxima que lhe demonstra afeto, seja em forma de gesto ou de palavra.

Apesar de ter conhecimento que todos já passaram por isso, a convivência com o meu brinde adolescente em casa é cada vez mais dolorosa. O grau de irresponsabilidade, desrespeito, insensibilidade, egoísmo e arrogância me comovem cada vez mais. A cada tentativa de aproximação, ainda sou obrigada a ouvir ironias, grosserias e outras formas de repulsão.

Por outro lado, a tristeza e a dor que vêm de uma relação com um ser de 16, 17 anos nos traz o mais profundo sentimento de vitalidade. A sensação de que "isso nós já superamos", ou a certeza de que "nunca seremos assim". As constantes lágrimas dessa relação reafirmam a nossa capacidade de sentir, de identificação com um ser sensível. Ou seja, a vida, de sua forma mais intensa, nos abarca sob a forma de raiva, de tristeza, de angústia. Melhor que seja assim, pois, neste caso, a dor é uma reafirmação de que somos vivos, temos sentimento e devemos superar todas as dificuldades.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

nostalgia

Pingo de chuva no telhado
camaleão na pedra
rede balançando...

Pegar minhoca pra pescar
cortar lenha pra larreira
e pinhão pra aumentar o fogo.

Almanacão da Turma da Mônica
primaiada reunida
brigadeiro na panela

Volta no lago
a pé ou a cavalo
Pão pros patos,
fuga dos gansos
Trilha no mato,
medo das cobras.

Bolo de chocolate no fogão
Pizza do vovô de massa grossa
Meia pra aguentar o chão gelado.
Nêspera na árvore
repleta de passarinho.

Água do riacho no quintal
laranja no pé
cheio de formiga
sapo na varanda
ao anoitecer
cheiro de onze-horas...
isso é infância.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Vazio

Dizem que o vazio é repleto do nada.
Discordo.
É um vácuo profundo,
que ecoa todas
as angústias,
neuroses.

Não há lacuna,
o espaço está cheio
de dor.
Nem tente sair pela brecha,
o vazio se impregna.

Está lotado
ao extremo.
Ele lateja no peito...
Impede a entrada de ar,
expulsa qualquer esperança.

Nada mais povoado
do que o vazio
repleto de solidão.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Eterna jovem

"Mó caô", dizia.
"Bahia de bicicleta...
tranquilo, só falta
um pouco de disposição".

mas é lindo conhecer o país,
fugir da sociedade conservadora.
mundo injusto,
família repressora.

quer a revolução,
foi pra rua acampar.
pegou uma chuva
que alagou a barraca
e resolveu pra sua cama
voltar.

se revolta com tudo,
quer mudanças.
não sabe o que quer da vida,
mas sabe que precisa de distância
desses caretas ao seu redor.

quem sabe o tempo...
deixe ela fugir de casa,
ir pra rua,
ser jovem eternamente.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

desconstrução

perdeu todo brilho
a espontaneidade, o pisar na areia
a carne de sobra
o sorriso luminoso.

Virou dona de uma casa,
sem jeito para ser dona.

Buscava nos outros
o que havia perdido em si.

Se espelhava nas outras
em busca de sua segurança.

Falava mal de quem
não estivesse perto
e sorria quando este
não estivesse longe.

Mudou pra pior,
agradou o marido.
Perdeu suas próprias palavras,
regrediu no futuro,
cavou seu presente,
e... segue rumo ao chão.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Fuja do monopolizador de papos

Existe coisa mais desagradável do que gente que monopoliza o papo? Nem ele, o encontro mais despretencioso, que ocorre em qualquer lugar, à vontade, sem regras, tem descanso. Frequentemente, aparece um mala que no nosso papo sagrado de todo dia quer mandar. Já chega escolhendo um assunto que ninguém está a fim de estender. No entanto, nada adianta, o incoveniente está disposto a enfiar o tema goela abaixo de todos ao redor.

Além de determinar o rumo da prosa, esse tipo gosta de falar apenas de sua própria vida. Sobre seu passado, suas vantagens (geralmente, eles têm muitas vantagens: como a melhor mulher do mundo, o apartamento mais maravilhoso de sua cidade, muitos amigos... ), sua rotina... E nada, além dele mesmo, parece lhe interessar. E ai de quem tentar falar de outro assunto. Geralmente, esses malas estão decididos a impedir que qualquer minuto da conversa esteja fora de seu alcance e de seu assunto preferido. Assim, nem adianta comentar sobre os filmes da semana, o show maravilhoso que vai ocorrer... Nada - nada mesmo - vai fazer o mala se tocar.

Para coroar a chatice e te fazer concluir, realmente, que está em péssima companhia, essa figura resolve contar as mesmas histórias velhas conhecidas. E o pior: quando todos comentam "ah, você já me falou", o mala insiste em recontar a mesma ladainha como se tivesse nos entregando o maior furo de reportagem da nossa existência. Para completar, quando o chato percebe que você está desviando o olhar em uma tentativa frustrada de resgatar um pouco de paciência, ele não se intimida e te cutuca: "ouviu o que eu disse, que impressionante?!"...

Não tem jeito. Monopolizador de conversa é do tipo egoísta, egocêntrico e, especialmente, chato. Sendo assim, vale a pena fugir, assim que notar a presença de um por perto.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

paisagem

Nunca tinha visto isso antes.
Uma luz estonteante invadia minhas retinas,
o mar inteiro, a areia e todo horizonte.

Era uma luminosidade tão forte,
tão colorida, que qualquer imagem erraria
na tentativa de descrevê-la.

A beleza radiante chegava a incomodar
quem insistia em permanecer com
os olhos vidrados
em sua direção.

Para mim, não bastava
sentir a ardência dos olhos,
nem um pouco da luz em minha pele.
eu queria fazer parte daquela paisagem.

Saí correndo para seguir a luz.
era uma corrida em vão, sabia.
No entanto, aquela beleza já me penetrava
e eu não sabia viver sem ela.
só me restava nunca me perder de vista
com a paisagem mais bela do espaço.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

2012

Não desejo planos no papel
quero sonhos reais.

passo longe da cabeça voando,
foco no pé no chão,
caminhando em direção
aos desejos concretos.

quero escapar dos esconderijos,
escancarar as feridas -
para poder cicatrizá-las

quero brindar à vida
o ano inteiro.
quero novidades,
não só na virada...

quero virar de cabeça pra baixo
sem ter vergonha.
desejo realizar todas as loucuras
sem tirar o sorriso do rosto.

procuro encontros,
fantasias, gargalhadas,
humor.
passo os dramas, as cobranças, a culpa,
os mesmos enredos.
só quero o novo.