domingo, 25 de março de 2012

Pina 3D


Arte e cidade se complementam
e transbordam sentimentos.

Quando falta palavra,
há dança e
expressão dramática.

Quando tudo parece perdido,
a procura permanece.
Não importa o rumo,
e, sim, a necessidade 
de busca e de construção.

Nada é certo ou errado,
tudo é loucura à flor da pele.
Excessos de drama e de leveza.
Peles que exalam 
os mais intensos cheiros.
Corpos que se deparam
com grandes abismos.

Terra, água, pedra...
Todos os elementos reunidos.
O ser humano precisa superá-los,
atravessar as armadilhas,
os perigos, os desastres,
o labirinto das próprias mentes,
a timidez que insiste em permanecer.

Só na superação e na eterna busca
encontra-se o caminho da dança.
Neste ponto, enfim, nos deparamos com a vida. 

sábado, 24 de março de 2012

Habemus Papam


A multidão precisa de alguém para confiar. Por não saberem o caminho a seguir, todos preferem depositar a sua insegurança em um líder que transmita força e estabilidade, que transforme as dúvidas em certeza, a ausência de convicção em fé.

Entretanto, quem há de querer assumir toda essa responsabilidade? Existe alguém que possa servir de guia para uma massa desacreditada e incorporar a figura de santidade mais próxima de Deus? Não há candidatos para esta dura tarefa, assim, cabe aos cardeais a escolha do próximo papa.

Esta votação, por mais justa que possa ser, transforma-se em uma cruel imposição ao eleito. Ele não tem chance de se esquivar, de escancarar seus medos, seus sonhos e, o pior, deve camuflar todas as suas inseguranças, para poder, desta forma, acalentar a multidão que o espera, como um rebanho de ovelhas que depende do seu pastor para sair do lugar.

Nesta obrigação de ser líder, ele se desespera. Percebe o quanto se aprisionou em sua própria vida. O quanto a presença de Deus e de todos os cardeais o tornava refém da solidão e de um déficit de acolhimento. A massa de pessoas de todas as partes do mundo o deixava transtornado, afinal, nada tinha a dizer a eles, a não ser que pudesse se abrir e expurgar todos os medos.

Deus havia determinado que ele deveria ser o próximo papa, porém, sua intenção não era essa. Ele queria estar nos palcos, em uma peça de teatro, longe dos fiéis e de toda a vestimenta, que mais parecia um peso. Mesmo correndo o risco de não ser perdoado pela divindade e pelos colegas, ele resolveu seguir o seu desejo - sempre reprimido - pela primeira vez na vida: virou as costas para a multidão, deu adeus ao Vaticano e se libertou das correntes. Concluiu que não nasceu para liderar e, sim, para seguir suas próprias vontades.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Insônia

De dia, os problemas descansam.
À noite, não me deixam descansar.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Verdinha

Seu apelido era Verdinha. Nunca gostou de ser chamada assim, entretanto, nunca fez questão de abandonar o hábito de só usar roupa verde, motivo pelo qual foi apelidada.

O armário da jovem parecia uma floresta, com roupas de diferentes tons da mesmíssima cor. Abrir as suas portas era como penetrar no meio da mata, sentir a variedade de texturas das folhas, observar o caule e a raiz de cada uma. Para não perder muito tempo se arrumando, era mais fácil optar pela primeira camiseta que via na frente, evitando entrar no labirinto da floresta em pleno quarto.

Nunca, desde que começou a escolher as suas próprias roupas, se vestiu de outra cor. As recordações de fotos e vídeos de quando era criança pareciam montagem, afinal, quem seria aquela menina com um vestido branco ou rosa? Ela mesmo não se reconhecia.

Na rua, os seus amigos só a chamavam de Verdinha. E sua fama se espalhava por todos os lugares. No entanto, uma pessoa não se conformava com a mesmice das roupas da jovem: sua mãe. Todos os dias, o modelito era motivo de briga, afinal, "o que pensariam todos ao redor?! Que você tem apenas uma roupa!", gritava a dona da casa. A filha fingia que não ouvia e saia com um pedaço da floresta em seu corpo.

Porém, uma manhã, na hora de se arrumar, Verdinha abriu o seu armário e foi surpreendida pelo desmatamento total: não havia mais nenhuma peça de roupa! Ou melhor, havia várias, mas todas novas, das cores mais variadas possíveis, nenhuma verde. Sem saber o que fazer, a jovem começou a gritar pela mãe, que não estava em casa. Assim, ficou completamente desesperada, perdida, sem saber como faria para sair de seu quarto.

Verdinha foi obrigada a escolher uma daquelas roupas novas para ir em busca da mãe. Optou por uma peça azul, o tom que mais se aproximava do verde. No entanto, continuou em estado de choque, não conseguia se enxergar no espelho, não foi capaz de caminhar com a roupa e, muito menos, de sair de casa.

A raiz fora cortada, junto com todos os galhos e folhas. Verdinha estava desolada, perguntava-se onde foi parar toda sua mata. Depois de muito choro, ela percebeu que era apenas mais uma árvore da floresta que havia sido derrubada. Agora, havia se transformado em um galho murcho, sem vida, resquício de toda destruição.

terça-feira, 20 de março de 2012

O fim da xenofobia e de outros preconceitos


Nós somos bichos... Aliás, nem isso somos. Os bichos não são capazes de fazer o que os homens fazem, ainda mais, com os seus iguais. Quem é capaz de matar, destratar, humilhar o seu diferente não percebe o quanto é pequeno diante do mundo.

Óh, ser tão pobre, superficial, desprezível, repugnante, ignorante. Não percebe que o mundo é de todos. Gigantesco, o globo azul guarda as singularidades de cada um, de cada povo, etnia, religião. Cultura, gênero, cor da pele, nacionalidade, nada disso importa. Não há fronteira, ou, pelo menos, não deveria haver. As grades devem ser extintas, deveríamos escolher onde desejamos fincar nossa vida.

Quem não enxerga a imensidão da natureza, da humanidade, do sentimento de fraternidade há um dia de ser esmagado por uma massa, uma comunidade internacional, de todas as cores e tipos, que, em um coro, em uma única vibração intensa, irá expurgar todo o preconceito, intolerância e xenofobia do mundo. Só assim as linhas imaginárias das fronteiras, dos limites, irão se acabar... junto com toda a podridão dos humanos que insiste em permanecer.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Paixão adolescente

Era um casal estranho. Ela não abria a boca nem para dizer "olá". Ele, por sua vez, acabara de chegar ao Brasil, falava com um sotaque francês engraçado. Também era visivelmente tímido, até sua própria postura curvada o entregava.

Eles mal se cumprimentavam durante a hora das aulas. Se cruzavam, os olhares se encontravam, imploravam uma aproximação... No entanto, os dois se travavam e não permitiam viver aquela sintonia total de uma paixão adolescente. Todos ao redor percebiam que ali haveria uma história. Porém, o que havia - de fato - eram tchauzinhos de longe e um aceno reticente.

Um dia, os dois se encontraram em uma roda de samba. Sim, apesar de serem tímidos, os dois gostavam do ambiente regado à música e à cerveja. Quando um notou a presença do outro, criou-se um constrangimento: uma chama interna, uma felicidade contagiante, um nervosismo enorme. Todos os sentimentos, ao mesmo tempo, de maneira intensa.

Os olhares de longe estavam incomodando todos. Alguns tinham vontade de empurrá-los contra a parede; outros de, simplesmente, convidar um deles para se aproximar do outro. Depois de muitos minutos, ele tomou coragem. Se aproximou da moça, que estava sentada com suas amigas. Educadamente, disse: "Posso conversar com você?". Ela fez-se de desentendida e levantou.

Os dois, finalmente, ficaram juntos. De longe, parecia um casal perfeito, com química de sobra. Entretanto, nunca mais se uniram. Talvez, a timidez ou o medo da entrega os afastaram de vez. Poderia ser também o destino, que insistia na separação, afinal, paixão adolescente parece com o carnaval... Depois de um tempo vira cinza.

As marcas

Eu posso, sim, me lembrar
No entanto, o que desejo é esquecer
O esquecimento seletivo
é meu ideal.

Simplesmente apagar 
da minha vida
todas as pessoas
que sonhei não conhecer.

Apagar as dores, mágoas e frustrações...
Os pensamentos negativos, 
o rancor...
tudo isso irei abandonar.
Mas as marcas... 
Estas, sim,
vou carregar para sempre.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Irmã

Tem mais coisa
que canto.
Aperto demais
para pequeno espaço.

Mais diferença
do que afeto.
Muita mágoa,
pouca sinceridade.

Cobranças eternas...
não há irmandade.
Laços estreitos...
rompidos por um penhasco.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Mãe

Bolsas profundas
ao redor dos olhos
um cansaço visível
entre as pálpebras
quase fechadas.

Uma garra determinante
em momentos de crise,
sempre disfarçando a água
que insiste em rolar
toda vez que vê um filho no chão.

Recordava dos tempos
de gravidez, de início de maternidade.
"Quando crianças nunca deram trabalho,
sempre foram um anjo", se orgulhava.

No entanto, hoje,
ela fugia do trabalho
para os socorrer.
Entregava a eles
a última gota de suor do dia,
os cedia a solitária
nota de dinheiro
de uma carteira vazia.
Continuava o expediente
ao lado dos filhos.
Isso, sim, era trabalho de verdade.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Do lado de fora

Ei, vem pra vida!
Aqui, do outro lado,
da janela azul,
tudo é mais bonito.

as paredes não são brancas,
aliás, não existem paredes.
o chão não é de madeira,
ele muda a todo momento.

há buracos, mas é só você ficar atento.
existem armadilhas que podem ser esquivadas.
Também é preciso cuidado
com a indelicadeza e maldade,
que estão à solta.

Mas, pode ter certeza:
existem paisagens, cheiros,
cantos, pessoas e sons
que fazem a vida valer a pena.

As mulheres do sexto andar


No sexto andar há cores e flores de todos os tipos, formas, idades. Muitas mulheres, em seus contornos, muita vitalidade. Força, garra... pra encarar a vida sem esquecer a risada de todo dia.Não há espaço para se amargurar com os problemas que as cercam. Todas ficam em pequenos quartos e dividem um banheiro, mas nada as impedem de brindar à vida diariamente.

O encontro da beleza com a vida contrasta com a pouca infraestrutura daquele velho e abandonado sexto andar. A sujeira que poderia repelir transforma-se em união, em luta. Elas limpam as casas, banheiros e quartos da alta sociedade francesa, mas convivem com a desordem da área destinada às domésticas. Entretanto, nada disso as tornam amarguradas ou infelizes.

O salário modesto, que poderia deixar a rotina complexa e difícil, não é impedimento para nada. Todas são pessoas simples e leves ao se olharem no espelho, porém, o reflexo não esconde o drama e intensidade de tudo que elas vivem.

As diferenças e peculiaridades de cada mulher não tornam-se barreiras e, sim, um impulso para a aproximação. Todas têm um lado Maria de ser: mãe, amiga, mulher, trabalhadora e, sempre, sonhadora. Muitos as olham e pensam: "como são corajosas"... Mas eu acredito: corajoso - de fato - é quem sai do sexto andar.

terça-feira, 13 de março de 2012

Palavra em fuga

Ela teimava em sair. Palavra fugida, perdida em alguns anos de abandono de si mesma. Logo ela, que sempre escreveu a galope, rápida, certeira. Hoje, ficava horas e horas em frente a uma tela em branco... e só vinha bobagem.Palavras e frases desconexas. Um apelo emocional clichê. Nada de interessante.

Percebeu que os anos de esquecimento, em que se abrigou em uma gruta distante de todos os sentimentos e reflexões, foram fundamentais para a perda da prática da escrita. Afinal, os poemas e contos só vêm aos que o procuram, em uma vida, repleta de construção e desconstrução, narrada pelas palavras.

sexta-feira, 9 de março de 2012

"A noite estrelada", de Van Gogh


Era início de uma noite de sexta-feira de uma Nova York congelante. A temperatura estava entre 5 e 7 graus negativos. Nos arredores da rua 53 havia um calor humano, em uma fila que virava o quarteirão à espera da entrada gratuita em um dos principais museus do mundo, o MoMA.

Aos poucos, os seguranças distribuiam as senhas de entrada e, conforme, as pessoas adentravam o belo prédio, todos iam a caminho do quarto andar. Uma procissão subia as escadas, outra parcela esperava o elevador. Alguns, com o mapa em mãos, já estavam prevenidos e sabiam - exatamente - para onde gostariam de ir. Mesmo sem marcar encontro, todos se chocaram no mesmo lugar: em frente ao quadro "A noite estrelada", de Van Gogh.

Uma multidão estava ali, era o point do museu. Todos queriam presenciar a obra de arte; alguns faziam questão de seu momento ilustre ao lado de Van Gogh; outros não perdiam um ângulo do quadro e não davam descanso à máquina fotográfica.

E os outros quadros ficavam ali, meio perdidos, esperando um pouco de atenção. Afinal, todos têm seu êxito, sua perfeição, seu questionamento. Não é à toa que estão expostos no MoMA. Artistas como Frida Khalo, Pablo Picasso, Mark Rothko, Vincent Monet, Henri Matisse, Gustav Klimt, Marc Chagall e outra eternidade de gênios também estão nas galerias do museu.

Entretanto, inexplicavelmente, a multidão insistia em permanecer em frente à obra de Van Gogh. Talvez, aquela imagem esteja presente no inconsciente do público; a popularidade da obra faz com que todos tenham a necessidade de conferir se, de fato, ela existe. O real motivo que leva milhares de pessoas a marcarem lugar e a fazerem hora em frente ao quadro é desconhecido. A única certeza que se tem é que os aquecedores do museu não fazem nenhum efeito comparados ao calor do metro quadrado mais disputado de Nova York.

Cidade cosmopolita

Este mundo tão grande
ao meu redor
me faz lembrar
o quanto meu mundo é pequeno.

Quando sou jogada
pro palco gigante
me perco
e acabo me encontrando
no meio de tanta diferença.

Eu me reconheço
em todos os tipos
gentes, cores, cabelos e religiões.

Gostaria de guardar
um pouco de cada um
em mim.
quero levar a imensidão
do mundo
para minha
mínima realidade.

Quero transbordá-la,
enchê-la de imagens,
de sons, de outros.
Quero crescer minha vida.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Mulher de aquário

O que mais me lembra você?
Cores, lenços e flores.
Aquele abraço que cabe o mundo,
a sala lotada de quadros,
fitas, pinturas, cacarecos, fotografias...

A falta de espaço a ser preenchido
O olhar que decifra tudo
antes mesmo de eu falar.

A risada escrachada,
que me chama de palhaça,
sem jamais me humilhar.

quarta-feira, 7 de março de 2012

uma tarde na Macy´s

Quase sempre
ela não se enxerga
na multidão.

Invisível,
senta-se na escada.
Todos a atropelam,
enquanto ela observa o mundo
do qual não faz parte.

O mundo a engole,
a enlouquece.
Um vai e vem constante,
muitas luzes, sacolas,
pessoas que anseiam pelo consumo.

Todos sorrindo em busca
de algo que necessitam
para camuflar toda a angústia
que carregam.

Enchem de maquiagem,
de sorrisos e compras,
ausência de naturalidade
e de pausa pra reflexão.

O tempo...
os passos não param
Tudo é preciso pra escapar da solidão.