terça-feira, 27 de novembro de 2012

O Palhaço

Nunca gostei de palhaço. Na infância, evitava o circo, pois temia encontrar aquele ser tão obrigado a ser feliz. Aquela felicidade maquiada em forma de batom vermelho, que cobria não só a boca inteira, como quase todo o rosto, me deixava extremamente angustiada. O palhaço, com a obrigação de fazer rir, me assombrava. A tinta branca na cara, o nariz, a roupa, tudo... tão artificial... Porém, sei que nunca havia conseguido ver um palhaço de verdade. Apenas nas telas do cinema tive a oportunidade.

Na sala escura, o palhaço é bem mais verdadeiro e transparente do que no picadeiro. A primeira vez que assisti ao filme de Selton Mello fiquei paralisada. Não sei ao certo o que mexeu aqui dentro, no entanto, reconheci que algo tinha mudado.

Já na segunda vez, percebi que o pânico do palhaço havia se transformado em uma sincera identificação, compreensão e, até mesmo, solidariedade. Como alguém consegue fazer rir quando ninguém o enxerga? Como ser feliz sendo obrigado a abandonar a dualidade da melancolia, da tristeza, da incompreensão? Impossível. Concordo que existem pessoas que nascem predestinadas a atuarem no circo, entretanto, ninguém nasceu para ser palhaço, para viver o dia inteiro sorrindo.

No filme, Benjamin é o palhaço melancólico Pangaré. São dois opostos unidos em um mesmo personagem, ator, diretor. Todos os sonhos de um ser humano estão ali. As cores ficam restritas ao palco, assim como as piadas prontas, o sorriso forçado. Já do outro lado da lona, Benjamin é mais um homem que sonha com uma outra realidade, que encontra a dúvida, a depressão e a tentativa de superar a dor como barreiras para sua vida pessoal e profissional. Os excessos, os dramas do palco transformam-se em uma rotina sem perspectiva e dura.

Benjamin busca ar, sair sem rumo, em busca de um amor improvável, platônico, que encontrou na sua trajetória de artista. Ele vive perseguido pelo desejo de ventilação. Quanto mais ele tenta sabotar essa vontade de mudança, mais ele se paralisa. Assim, o palhaço percebe que precisa assumir sua característica humana e vencer os medos embarcando no seu próprio rumo. Longe dos palcos, ele vai em sua estrada, no interior de Minas, e esquece sua felicidade aprisionada. Ao exibir sua melancolia, ele, finalmente, consegue encontrar os objetos mais importantes de sua história: sua identidade e seu ventila(a)dor.