sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

2013

Inevitável chegar neste período sem pensar no ano novo que já está batendo a nossa porta. A virada simbólica pode se tornar real quando colocamos em prática, a partir do dia primeiro, os planos que estão nos caderninhos escondidos no fundo das gavetas. Para isso, desejo a todos um 2013 de realizações. Em que haja muita coragem e determinação para lutarmos pelos nossos sonhos, que a gente tenha força para assumir nossas escolhas e encarar suas consequências.

Desejo o fim da hipocrisia, da falsidade, das pessoas egoístas e egocêntricas, de gente insensível, grosseira e dissimulada. Espero encontrar pessoas de diferentes cores, cantos e encantos, que sejam filhos de Oxum, Ogum, Xangô, Iemanjá, Iansã... Gente que vibra, que dança, que bebe, gargalha. Amigo de bar, de cinema, de livro, de cachoeira, de dança, de trabalho, de sonho. Quero ouvir o que o outro pensa, não o que desejo escutar. Quero aprender a ouvir críticas, opiniões sinceras, ao invés de me contentar com mentiras agradáveis e superficiais.

Espero, com todas as forças, que 2013 seja intenso. Traga músicas belas, rodas de samba inesquecíveis, ideias criativas, peças, filmes e livros emocionantes, paisagens impossíveis de serem fotografadas e de serem esquecidas, pessoas especiais, com experiências e opiniões diversas, cervejas estupidamente geladas, chopps com colarinho, picnics nos gramados com toalha quadriculada, passeio de barco, trilha na mata, mergulho na cachoeira, manifestações lotadas, exposições com fila na porta, mochila nas costas e pé na estrada. Durante a rotina, espero que a gente tenha a mesma garra e prazer para executar as tarefas no trabalho, interesse nos estudos e concentração para concluir todos os deveres.

Nos próximos 365 dias que virão, nos momentos em que o desânimo, a dor e a solidão vierem, que a gente consiga criar uma força interna para transformar as dificuldades em novas oportunidades de ser feliz. O bem-estar, a alegria e o prazer são sentimentos conquistados. Desta maneira, quando não conseguimos alcançar a paz interior precisamos ter a consciência que, nós mesmos, somos responsáveis pela maneira que vivemos e sentimos. Amar intensamente a vida, as pessoas, os lugares, tudo que nos cerca, é a forma mais produtiva de ser feliz. Ser honesto, sensível, solidário, apaixonado, sincero e bem-humorado são ótimos atalhos. Não adianta culpar o próximo pelo nosso fracasso e, sim, nos responsabilizar por todas as nossas escolhas. Devemos evitar tudo e todos que nos fazem mal. Ao mesmo tempo, podemos procurar os lugares, cheiros, gostos, abraços e vistas que nos acolhem. A partir do dia 1 de janeiro, nós pintamos o calendário em branco. Basta querermos e lutarmos por um ano colorido e vibrante.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Duas visões sobre o Ocidente: Argo e Rota Irlandesa

A experiência de olhar para nós mesmos e tentar se distanciar do óbvio, dos hábitos viciados e abrir espaço para uma reflexão crítica é algo extremamente difícil. Ainda mais se tratarmos de assuntos polêmicos, como religião, guerra e diferenças culturais marcantes. No entanto, em cartaz nos cinemas, estão dois filmes que possibilitam duas visões distintas das práticas ocidentais em oposição à cultura oriental.

Ao assistir "Argo", de Ben Affleck, o espectador não consegue tirar os olhos das cenas impactantes, com uma reprodução incrível da realidade dos reféns americanos durante a revolução islâmica de Khomeini, em 1979, no Irã. O filme é daqueles de tirar o fôlego, não há tempo de refletir na sala escura, apenas de se angustiar com a situação dos diplomatas estadunidenses que vivem meses em sigilo na casa do embaixador canadense, enquanto toda cidade de Teerã está em ebulição. A operação Argo, que torna-se pública mais tarde, realizada pela CIA, conseguiu resgatar os reféns americanos do Irã em um período que o país disseminava o ódio contra os Estados Unidos, depois da queda do Reinado Xá, que contava com o apoio americano. Com a Revolução Iraniana, de 1979, o modelo autocrático  foi derrubado e o xá recebeu asilo político nos Estados Unidos, presidido por Jimmy Carter, o que gerou uma revolta da população do Irã. Durante a ditadura do xá Mohammad Reza Pahveli, por sua vez, o Irã viveu anos de forte repressão, disseminação da polícia secreta, corrupção e ocidentalização.

Assim, neste contexto em que os iranianos pregavam o antiamericanismo e anti-ocidentalização do país, ocorre a operação Argo. O filme, inicialmente, retoma os anos anteriores à Revolução Iraniana e, de fato, comprova que o regime do xá teve apoio norte-americano. No entanto, no decorrer, os traços orientais são sempre vinculados às práticas violentas e intolerantes, enquanto os americanos são colocados no papel de vítimas de uma sociedade "selvagem", em que não há diálogo e compreensão da diferença. Desta forma, "Argo", apesar de ser perfeito cinematograficamente, é extremamente parcial e superficial na busca da compreensão do embate entre o ocidente e o oriente. O filme não propõe uma reflexão, ele apenas impõe ao espectador que torça para os diplomatas estadunidenses retomarem com vida ao país ocidental, enquanto no Irã ocorrem enforcamentos, grupos armados pelas ruas, fanatismo religioso e perseguição contra os que infringem às leis do Islã. Quem assistir ao filme na expectativa de uma nova oportunidade de conhecer o Irã vai encontrar a mesma lente batida em reportagens de TV, jornais, ou seja, mais uma visão clichê do país.



Do Irã para o Iraque, em contexto muito distinto, "Rota Irlandesa", de Ken Loach, abre espaço para uma reflexão sobre a Guerra do Iraque. O tema é tão atual que não é possível dizer com clareza se o conflito já teve um ponto final. Assim como as dúvidas que existem acerca do início e fim da batalha comandada por George W. Bush, o filme apresenta as incertezas e conflitos internos dos soldados ingleses que foram para a guerra atraídos pelo bom salário em um contexto da crise europeia.

Desta forma, "Rota Irlandesa" já humaniza os soldados de guerra. Aqueles que têm função de combater, atirar, são extremamente humanos, vivem a crise em seu país, o desemprego, além de apresentarem dificuldades em lidar com as atrocidades da guerra. Para complicar ainda mais a situação, um dos amigos, Frankie, morre em situação não esclarecida, o que leva o protagonista Fergus a investigar a morte do companheiro. Para isso, Ken Loach vai fundo nas contradições humanas, em que o poder, as diferenças culturais, a luta por dinheiro, prestígio, a dor e os instintos mais primitivos se misturam em um ambiente hostil, embalado por uma batalha questionável e cruel. Além disso, o filme utiliza imagens reais e documentais do conflito iraniano.

A  perversidade da guerra é refletida com o pano de fundo de uma das estradas mais perigosas de Bagdá. Porém, quem assistir ao filme "Rota Irlandesa" pode chegar a conclusão de que o risco e a violência não existem apenas no Irã e, sim, são condições sine qua non de todos os humanos.


terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Dia de Iansã: a orixá feminista

Hoje é o dia do despertar das mulheres. O dia 4 de dezembro é vermelho vibrante, com uma voz forte, presença intensa de Iansã, Oyá, a orixá feminina que é a encarnação do desejo, da potência, do sentimento. Diante de uma sociedade que mascara o machismo e os rituais de subordinação das mulheres, que permanecem sofrendo desigualdades nos ambientes domésticos e de trabalho, Iansã foge de todas as amarras.

Enquanto na religião católica, a figura feminina é representada pela pureza das santas, a deusa sagrada da Umbanda e Candomblé é indomável, sedutora, provocativa, compra briga, faz trovoar. É impossível conhecer uma mulher de Iansã que não marque presença, que não modifique o ambiente. A deusa guerreira vai para a briga em busca da vitória, não teme nada, no entanto, faz muitos a temerem. Apesar do jeito difícil e pouco maleável, Oyá não perde a sensualidade e conquista o coração de muitos ao redor, o que gera ainda mais insegurança dos outros que não compreendem o tamanho poder de sedução da rainha dos céus.

Atualmente, a ausência de Iansã é percebida no gênero feminino. As mulheres são submetidas a múltiplas violências – a maioria silenciosa - e veem seus movimentos de desejo paralisados, sendo restritas e territorializadas nos papeis de mãe e de esposa. Assim, a mulher acaba habitando a sombra do marido, sendo vista como um objeto de desejo que deve ser conquistado, como alguém que deve seguir um padrão, deve despertar o interesse do homem para, assim, poder se realizar afetivamente. Os homens, por sua vez, sempre ficam no papel de poderosos, que podem escolher as “suas presas”, conquistá-las, usá-las, em uma dinâmica desigual e machista. Neste momento, entra em cena a segurança de Iansã, que não aceita ser subordinada, que cria a situação sem se abalar. As mulheres do dia 4 de dezembro não dependem de homem nenhum, agem sozinha, falam o que pensam, sem se limitar aos padrões sociais.

Em um modelo de sociedade patriarcal, em que o sistema masculino de opressão das mulheres permanece de forma disfarçada, há uma urgência da presença de Iansã. A senhora dos ventos e das tempestades precisa penetrar em todas as mulheres. Com a sua firmeza e valentia, ela consegue defender os seus princípios e seu espaço. Já com a sua doçura, dança e sensualidade natural, Iansã representa uma mulher de personalidade forte, sedutora e atraente. Oyá é feminista e feminina, vaidosa e bruta, doce e valente: é a orixá que expressa a dualidade, a contradição, sem se entregar às convenções.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

O clichê de dezembro

Eu quero que passe logo. Nossa, como esse ano passou rápido! Gente, já é Natal. Até agora não sei o que fazer na virada do ano. Todo mundo vai viajar e eu ainda não planejei nada... Aprenda a organizar seus gastos de fim de ano para não sair no prejuízo...

Nossa, são tantas frases e sentimentos clichês em dezembro que, no terceiro dia do mês, posso dizer que já estou exausta. As pessoas ficam sedentas por atenção, por confraternizações, por uma felicidade inexistente. Não basta viver, temos que compartilhar nossos encontros, as mensagens iguais em todos os anos anteriores, os amigos ocultos das empresas, faculdade, escola etc. Tudo tão repetitivo, rituais que não cansam de ser executados.

Nesta época, até o cinema fica sem graça, com uns filmes mortos, que tentam se dar bem com a proximidade natalina comercial. As lojas te veem como um alvo, os vendedores como um otário que vai engordar as comissões de venda e deixar todos os trocados por aí. Em todo o lugar que se passa, dezembro deixa um desespero, uma reta final cansativa, em que todos saem no tapa para ultrapassar a linha de chegada.

O trânsito representa bem esse sentimento apocalíptico do mês 12. Todo mundo quer andar, chegar logo, mas ninguém consegue sair do lugar. Cada motorista, sozinho no seu carro, deseja driblar todos ao seu redor, porém, não conseguem nem olhar para o lado e aproveitar a música no rádio, a bela criança que insiste em gargalhar no meio da rua, reconhecer o amigo de infância que está no carro ao lado... Nada disso importa, afinal, são tantos eventos ao mesmo tempo, tantos encontros marcados na agenda, que não há tempo para apreciar a vida.

Dezembro é o mês da geladeira, de consumir todos os alimentos que foram guardados o ano inteiro e estão prestes a vencer. É o mês da balança, em que você revive em sua cabeça tudo o que fez e deixou de fazer durante o ano inteiro e se cobra a cumprir todas as metas ignoradas em menos de quatro semanas. Além disso, você é obrigado a conviver com um calor fenomenal, que mistura a tensão, a correria com um tempoquepassarápidodemais, mas nunca o suficiente para livrar todos nós dessa agonia que só acaba com o início de janeiro.